26 outubro 2008

Conversas com a minha menstruação

O cabrão de merda está atrasado. Já há muito tempo que não se atrasava assim, não tantos dias…

Quem é que ele pensa que é, mas por que ser superior ele se toma? Afinal quem manda aqui?

Lá porque tem o poder da viscosidade e consegue, por alguns esporádicos dias, controlar toda e qualquer acção de minha parte, lá porque me comanda os pensamentos e me faz estar fora de mim, tem lá o direito de se ausentar assim? Não tem, não...

Eu reclamo, eu blasfemo, eu desejo que morra, mas realmente a sua presença faz-me ter a certeza que tudo está bem, que o mundo não parou de rodar e que estou a funcionar como deve ser. A sua presença, duma maneira descontrolada, faz-me sentir mais mulher, mais senhora, faz-me sentir que tenho um propósito.

Mas então onde andas? Por onde paras? Por que te ausentas quase um mês das minhas entranhas mais profundas? Por que me abandonas quando te espero com três ou quatro aplicadores na mão?

Está certo que não devia ter parado com aquilo que te controla, e peço desde já desculpas por ter que te controlar, mas entende vermelho, vermelhinho, vermelhão, entende que estavas a dirigir a minha vida. A tua imprevisibilidade tomava conta do meu dia-a-dia e eu preciso de controlo, preciso de certezas, não poderia continuar a viver com essa tua irresponsabilidade.

Consegues perceber porque o fiz? Consegues assimilar no fundo a importância da tua presença na minha vida, mas ao mesmo tempo, da certeza que essa presença não foge do meu controlo e que posso saber quando te tenho e quando te espero? Consegues perceber que és tudo o que odeio ter e tenho medo de perder?

A minha falta de fé recusa-se a acreditar num milagre da concepção, pois só isso explicaria a tua ausência tão prolongada, mas então porquê te foste sem nenhum motivo maior, sem deixar nada a substituir? Só faz sentido que te vás se me deixares algo que me recorde de ti. Algo que me revolte por dentro como só tu o sabes fazer, algo que me lembre que estou viva e tenho vida para dar, algo que doa só como tu sabes doer e mais ainda, para que te possa dar valor, para sentir a tua falta.

Mas não, não tive nem perto de gerar vida e isso recordas-me tu sempre que apareces, sempre que te esvais. És tu que me recordas sempre de que só te tenho a ti, que só tu me conheces por dentro como ninguém e só tu sabes o sabor do meu eu, e mesmo assim nunca entras para me proteger e me alimentar, muito pelo contrário. Sais, como quem tem pressa de conquistar o mundo e de me enfraquecer, ou sair donde nunca foi feliz. Não és feliz? Não te dá alento o calor do meu ser, não te dá forças aquilo que me roubas sempre que foges levando algo de mim?

“Não te amo… mas quero-te” já dizia Sá Carneiro, que sendo homem sentia a mesma dor, a mesma vontade, a mesma necessidade que eu sinto por ti. Talvez ele se dedique a outros tipos sanguíneos, mais femininos… eu dedico-me a ti, que afinal, és tão e somente parte de mim.

2 comentários:

  1. Pergunto eu, como pode alguém falar de forma tão poética sobre tal tema? Menstruação? Menstruação??? Eu não diria coisas nada bonitas se escrevesse sobre a tal senhora de vermelho que me chega todos os meses com um soriso estúpido e diz: olá! Sou a tua menstruação!! Só tenho a dizer uma coisa, apenas duas palavrinhas para essa senhora de vermelho: Pu-ta.
    Mas atenção, acho bonito o que escreveste, diria mais até, acho profundo e claro, como não poderia deixar de ser, sentido.

    maria

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  2. Já escrevias algo sobre o dia 30, ahm...!!!!!

    Afinal o que andas a fazer para não ter tempo para postar????

    Kiss
    G

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