12 maio 2011

The one with the broken head....

Pois é. Parti a cabeça.

Passei eu uma infância/adolescência/adultíce, a subir às árvores, a esfolar-me no asfalto, a partir a cabeça dos outros... e a minha sempre se manteve intacta e inalterada perante as pedras dos outros.... foi preciso entrar no mundo laboral para saber o que custa abrir o crânio com muita força.

Depois do tal acidente da semana anterior, e confiante que estava pronta e fina para o trabalho, resolvo voltar em plena época de trabalho de campo. Três dias intensivos de montagem de ninhos para os abutres, coitadinhos dos passarocos que não têm onde dormir, e por isso lá andamos nós com barras de ferro de 9 metros pelo matagal cerrado adentro só naquela de procurar a melhor árvore no meio de milhões para que os senhores abutres possam vir viver para os nossos belos e amarelos habitats....

Seguidamente são 6 horas para preparar, montar, decorar e finalizar todo o condomínio privado que criámos e montámos para os nossos amigos comedores de bichos mortos. Até aí tudo bem, é para isso que me pagam, e andar dias infinitos ao sol a ser comida viva por elefantes voadores, a comer barritas de cereais, e a carregar fardos de troncos pesados é talvez uma das coisas mais divertidas que se podem fazer num dia de calor.

Pensava eu. Mas estava enganada. O mais divertido é fazer isso tudo e depois levar com um desses troncos que são elevados para o cimo de árvore para o senhor abutre assentar o cagueiro, bem em cheio na tola.

Existe uma catrefada de gente debaixo da árvore a preparar os troncos para ascenderem ao futuro T2 que se está a construir, e é mesmo na minha cabeça que bendito tronco se vai alojar.

Será isto azar? Vontade divina? Boa pontaria? ....

Como já tinha acontecido algumas vezes, escuta-se a palavra “cuidado” quando um dos milhares de troncos que fazem a subida cai a pique, e normalmente levanto o braço de modo a proteger a cabeça e a cara, mas a verdade é que a cabeça é bem maior do que o que o braço protege, e não foi preciso muito para levar com ele em cheio no meio da massa encefálica.

Só senti uma dor aguda pelo cérebro adentro, e quando pus a mãe no sitio afectado senti que havia alguma coisa que não estava bem, pois além de começar a sentir algo viscoso a escorrer-me pelo pescoço abaixo, havia uma falha tectónica que não deveria existir.

O único médico presente no meio daquela herdade de umas quantas dezenas de hectares era um veterinário, perfeito para me tratar portanto. Veio a correr na minha direção e quando olhou o estrago só disse: “Niña, nos temos que ir ahora”. Eu, que estava pálida, fiquei amarela e disse “Partiu-se?”. Ele para me animar disse que seriam só uns 3 ou 4 pontos, nada de grave, mas que tinha que sair do meio do mato naquele preciso momento se não podia apanhar uma infecção gangrenaria e ter que amputar a cabeça, o que não era coisa boa com certeza.

Um ou dois voluntários vomitaram-se quando viram o sangue que me escorria pela cara abaixo, e o meu chefe (pessoa que estava em cima da árvore a recepcionar os troncos e a fazer pontaria à minha cabeça), estava pálido e imóvel quanto se apercebeu que tinha falhado redondamente a tarefa de me assassinar.

Depois lá fiz alguns quilómetros pelo mato cerrado em direção à carrinha com uma camisola alheia a estancar o sangue, depois fizemos a meia hora de caminho acidentado dentro da herdade até chegar à estrada, e ainda tive 3 taquicardias durante o percurso de carro devido às ultrapassagens que o meu colega fazia nas curvas com traço contínuo e desfiladeiros nos dois lados, até chegar a Barrancos, a civilização mais próxima.

Chegados a Barrancos lá nos disseram que o posto de saúde só estava aberto a certos dias da semana, e por isso as pessoas já sabiam quando podiam ou não ficar doentes, e que naquele dia havia apenas a senhora da recepção que por muito boa que fosse a fazer bainhas, não tinha agulhas que furassem o couro cabeludo.

Fomos então por mais uns 10 Km até Espanha, a civilização mais próxima, onde fui muito bem recebida por um enfermeiro que resolveu experimentar os agrafos novos que tinham chegado na minha cabeça, perguntando sempre à colega do lado se era assim que se fazia, e prometendo-me sempre que o próximo não doía. Depois de agrafada a cabeça 6 vezes, fui ao médico que me fez perguntas pessoais para testar a minha cabeça pela parte de dentro, se bem que como não entendia nada do que eu dizia, não poderia saber se as respostas estariam ou não certas, mas calculou que eu estava com ar convincente de quem sabia o nome completo, a data de nascimento, morada e número das cuecas.

Depois de responder se me tinha caído um pau na cabeça ou me tinham atirado um pau à cabeça, pergunta que me deixou hesitante pois não sei ao certo até que ponto todos estes meus “acidentes” têm sido uma grande coincidência, lá voltei eu satisfeitíssima com o serviço espanhol de saúde, em que me deram analgésicos de graça, não paguei absolutamente nada por ter sido agrafada e consultada e ainda fui atendida no segundo em que cheguei.

Em Portugal teria estado numa cadeira com uma pulseira cor de rosa, até não ter mais um pingo de sangue para perder, quando me chamariam para preencher a ficha de registo e aguardar um bocadinho mais para que todos aqueles com tosse de cão fossem atendidos.

Posteriormente, quando fui tirar os agrafos, a enfermeira ficou também pálida e amarela quando viu o estado em que a coisa estava, o senhor apesar de ter andado a cortar o cabelo, agrafou por cima de umas quantas madeixas não deixando sequer ver o estado em que a ferida estava, e levou-me a ajoelhar a todos os médicos que existiam no centro para que alguém lhe confirmasse que aquilo estava muito mal feito e não era assim que se fazia a coisa, porém ninguém lhe deu razão e disseram que os cabelos até eram bons para cicatrizar melhor a ferida. Ela terminou com “laia dos médicos, defendem-se todos uns aos outros...”, e lá me foi tirar os ditos agrafos.

E foi assim que deixei o meu ADN no ninho do abutre, o que poderá servir para atrair algum casal para aquele apartamento, já que dizem que tenho o sangue doce.

Nesse dia a senhora das limpezas do meu trabalho tirou-me o mau olhado, poi ou ando mesmo cheia de olhares malignos, ou alguém quer que eu experiencie uma morte dolorosa muito rapidamente.

Fui então de férias uns dias depois. Correu alguma coisa mal, perguntam vocês?

Isso já fica para outra história.

10 maio 2011

Estrangeiros e defenderes

Não comecem já a reclamar por esta minha ausência prolongada, pois o facto de ainda ter mãozinhas para escrever é um mérito que ninguém me tira, nem que puxem com muita força!

Das 7 vidas que eu tinha já só me restam 5, e consegui esta proeza em apenas duas semanas. Formidável não é?

É o chamado mau-olhado… ou a puta da inveja, como preferirem.

Apesar da minha vida ter estado inumanamente fugaz nestes últimos meses, houve alguns episódios na minha existência recente que por pouco não puseram este blog inactivo para todo o sempre.

O primeiro de todos, e quiçá o mais importante, é o facto de ter tido o chamado acidente de viação que quase me levou desta para muito pior.

Para aqueles cuja vida roda em torno da minha pessoa, tenham calma e não fiquem já de lágrima no olho, que estou pelo menos com as articulações finas para continuar a escrever coisa da boa (ohhhhh – dizem vocês em tom de lamento).

Apesar de não ter sido considerada sequer ferida ligeira, a coisa foi grave e foi todo um conjunto de factores e amuletos que me permitiram voltar a casa apenas com as chamadas escoriações ligeiras.

Mas passo a explicar o sucedido:

Ia eu no grande Defender utilizado no âmbito laboral da minha pessoa, quando retorno a casa de mais um grupo de crianças fofas e queridas (quando caladas), numa estrada em linha recta, sem traço contínuo, margens grandes…. portanto nada que supusesse que poderia acontecer algo de drástico ou perigoso.

Na minha frente segue a chamada furgoneta estrangeira, com um casal de senhores que deveria ter parado de conduzir assim que deixou de dizer lápis, para dizer lápes.

Eu já tinha visto o senhor fazer algumas guinadas estranhas como quem procura uma qualquer entrada no meio do mato para ir explorar a coisa ou um local tranquilo e escondido para fazer o amor. Não querendo eu atrapalhar a coisa, muito menos assistir ao sexo octogenário, resolvi ultrapassar o senhor para seguir a minha vidinha e ir em frente que é o caminho.

Ora no momento da dita ultrapassagem, o senhor deve ter visto um bom arbusto e guinou na minha direcção enquanto eu estava ao seu lado. O meu instinto foi guinar na direcção contrária de modo a evitar o embate, e foi o que fiz, e que não teria sido nada de mais se não tivesse eu nas mãos o camião tir dos jipes.

Ora o carro, como qualquer jipe, é grande e instável e muito fácil de capotar. Foi o que aconteceu… Perdi-lhe o controlo quando guinei para me desviar dos rufias idosos, e ao tentar controlar o carro acabei por capotar, tendo o carro se virado num lado da estrada e indo a derrapar até à outra via.

E agora até parece que estou a descrever o sinistro à companhia de seguros, mas a verdade é que não há outra maneira de o fazer.

O carro, enquanto deslizava pelo alcatrão, com a minha cara colada ao asfalto a ouvir a chaparia toda a partir e os vidros a caírem-me em cima, só parou com as rodas espetadas num sobreiro que me salvou a vida, pois se não estivesse ali naquela altura e naquele momento (poderia ter ido dar uma volta, claro), o jipe tinha continuado o capotanço pela ribanceira abaixo e aí sim, não haveria mais espaço belo e amarelo para ninguém.

Depois do carro parado (ao contrário, mas parado) e de acabado o ruído, desliguei o motor e fiquei à espera de acordar do pesadelo.

Vi um senhor aproximar-se enquanto chamava a ambulância e a senhora do casal octogenário veio-me agarrar na mão e falar qualquer coisa numa língua estrangeira que não entendi. Quando percebeu que eu estaria viva foi embora à sua vidinha que com certeza, teriam mais que fazer.

Entretanto foram chegando mais pessoas que me ajudaram a sair do carro, nem sei bem por onde, que recolheram as minhas coisas espalhadas pela estrada, e os restos que sobraram do meu telemóvel, e quando chegaram os bombeiros foi uma viagem longa até ouvir a voz da minha relíquia quando descia a pique da ambulância.

Ela tinha um pior estado do que eu, e só descansou quando me viu o dedo grande esticado em sinal positivo, já que o resto do corpo estava entalado no meio de ataduras e coleiras cervicais.

A moral da história é que eu fiquei bem e os estrangeiros não prestam. Uns cortes e arranhadelas, umas dores nas costas durante uns dias e uma história para contar. Mas o pior disto tudo não foi as pessoas que causaram o acidente terem ido à vidinha deles sem sequer pensarem duas vezes. O pior de tudo nem foi o Defender ter me defendido a vida e perdido quase a dele à conta disso já que ficou todo partidinho.

O pior, o pior, mesmo o pior de tudo…. Era eu querer mijar e ninguém me deixar.

Eu já estava apertadinha enquanto conduzia. Aconteceu o acidente, entrevaram-me numa maca, e nem uma porcaria duma arrastadeira eu podia utilizar porque não podia mexer as costas.

Até ser atendida num hospital público com pulseira verde, até fazer raios-x a todos os ossos existentes do corpo humano e mais alguns, até esses exames serem vistos e confirmados, até eu gritar pelo hospital inteiro que queria mijar (enquanto me mandavam fazer nas calças)…. Até eu desesperar passou muito tempo e sofrimento… mas por fim lá me disseram que não tinha lesões, e eu fiquei por poder mijar….

Na semana seguinte parti a cabeça. Mas esta fica para depois….