10 outubro 2010

o cheiro da chuva... só porque sim....

Os anos 80 voltaram em força, e em algumas áreas, chegou até ser violento.

É ver as meninas no alto da sua juventude, que é como quem diz, no alto dos seus tacões, com roupinhas muito vintage, padrões muito antigos, e com todo o ar de “i’m here, i’m igualzinha a todos os outros, get habitueitede” e aposto que as mães e avós destas vendidas choram baba e ranho porque quando lhes ofereceram aquela roupa de quando eram jovens, foram chamada de retrógradas, antiquadas e quiçá nomes cheios que mereceram um par de estalos bem dados.

Mas não é só na moda que os anos redondos voltaram: é na decoração, é na música, é na postura… realmente a coisa é cíclica, e o que a semana passada era cool, hoje é muito démodé (adoro este palavra… démodé). E temos que estar de olho, porque numa semana podemos ser apedrejadas com muita força se ousarmos não ter enchumaços nos ombros como se tinha antigamente, e se na próxima semana os usarmos… ai senhores… é melhor levar guarda-chuva, porque nos vão escarrar.

Mas há uma coisa que não volta. Infelizmente o modo de vida não volta.

Lembram-se de que antigamente quando um filho fazia 18 anos e saia de casa, ia estudar, ia trabalhar, ia-se tornar adulto, ganhar o próprio sustento, constituir a própria família? Lembram-se desses tempos?

Vinha a casa ao domingo e levava algumas frutas e legumes da horta, e os muito bons filhos ainda ajudavam os pais com o pouco que começavam a ganhar. Pedir dinheiro aos pais era uma vergonha, porque já se tinha idade suficiente para trabalhar, e um corpinho bom para isso. E os pais, que ansiavam pelos 18 anos desde o dia em que ouviram o choro do filho pela primeira vez, faziam planos para o quarto da criança ao longo dos tempos, até ser finalmente transformado num ginásio, quando nos gloriosos 18, o filho saí do ninho.

Era assim que era. Era assim que devia ser. Mas não é.

Hoje em dia, qualquer jovem que se preze vive na casa dos pais até ter pelo menos o direito legal de poder dizer Lápes em vez de lápis. Saí-se de casa para estudar sim, mas depois volta-se.

Chega-se a casa, depois de alguns anos fora, e pendura-se todas as licenciaturas, mestrados e doutoramento na parede no quarto, onde, outrora estavam os Backstreet Boys.

Volta-se a não fazer a cama e a comer comida da mãe. Mas aqui há que ser justo, afinal há muito boa gente que vai estudar para fora, mas cuja mãezinha lhes vai limpar o quarto e manda sempre a comidinha em tapperwares com o nome de cada dia da semana escrito, por isso a continuam a viver com os pais, mas em casas geograficamente diferentes.

Há muito cidadão cuja saída de casa para estudar serviu apenas e somente, para poder fumar umas coisas em casa sem os pais a melgar, e poder mostrar às outras meninas e meninos, que são grandes o suficiente para limparem o rabo sozinhos.

Hoje em dia já não se pensa sequer em comprar a própria casa, em viver sozinhos, em pagar as próprias contas. Hoje em dia, a solução encontrada para superar desempregos e empregos precários é continuar a viver com os pais. Eles pagam as rendas e as contas, e um dia, se tudo correr bem, irão morrer e depois fica-se com a casa. É portanto, um jogo de paciência.

É triste, mas a verdade é que os jovens já não têm as condições que lhes permitiam crescer e ser adultos. Não há empregos, não há vontade de fazer planos, de pensar no futuro. A incerteza e o medo do que aí vem é tão grande, que realmente é mais seguro viver outra vez com os pais, dormir na cama que se mijou tantas vezes, comer aquela comida que sabe tão bem porque não se comprou, não ter que recear abrir o correio com contas para pagar, e acima de tudo, o pouco que se consegue, como licenciados a trabalhar numa caixa de supermercado, dá para comprar os cromos que faltam e os jogos para a consola.

O que acontece agora é que os jovens fazem eternamente o papel de filho, passando a ter o papel principal apenas depois de casar, depois de os pais morrerem, depois de muitos anos, e perdem uma fase essencial de transição entre ser filho e ser pai.

Esta geração é mais insegura. No passado, os pais criavam os filhos para crescerem profissionalmente e serem independentes, mas actualmente houve uma mudança e os pais passaram a ser cobrados para proteger ao máximo e dar tudo que os filhos precisam.

Perdeu-se o essencial de sair e ser independente, ver a vida com outros olhos, valorizar o esforço dos pais, e saber o valor que as coisas têm. Perceber afinal de onde vem a cama feita, a comida pronta, a casa limpa e a roupa lavada. Perceber que afinal de contas há suor e trabalho por detrás dessas tarefas aparentemente tão simples, e que nos caiam feitas em cima do colo, como se de magia se tratasse. É essencial compreender as magias dos pais, e acima de tudo, começarmos nós a fazer essa magia.

Felizmente eu ainda nasci nos anos 80, e por isso ainda tive esse bichinho de crescer e trabalhar, comprar casa, ter o papel principal na minha vida, sem intermediários. Desde cedo que os meus pais me puseram a servir cafés para comprar as merdinhas de adolescente que achava imprescindível ter. Desde sempre ganhei o meu dinheiro, esbanjei o meu dinheiro, e soube dar valor ao trabalho árduo de um mês inteiro a servir, para tão pouca recompensa no fim do mês. Hoje, orgulho-me de ter 25 anos e ter casa própria. Irei pagá-la até morrer, mas é minha, comprei e pago-a todos os meses. O trabalho por enquanto é certo, mas não é infinito, e claro que isso é coisa para dar um frio na barriga, mas sei que há muito por aí, e por muito difícil que seja arranjar emprego na minha área, uma coisa é certa, sei tirar imperiais como ninguém, e sem trabalho é que não fico.

Sabe bem ir a casa de fim-de-semana, dormir na cama que nos embalou, vestir os pijamas com ursos, e comer os petiscos que nos fazem especialmente. E é por isso que sabe bem, porque não vivo lá. A casa dos meus pais é a máquina do tempo que me faz voltar ao passado feliz, e estará lá, tal como o colo deles, sempre que eu precisar.

O que é isto tem a ver com o cheiro da chuva?

Nada... mas está a chover... e diz que cheira...

3 comentários:

  1. Só tenho pena de não ter a casa da minha mãe à distância de um comboio...

    ResponderEliminar
  2. true true and true.
    A ultimas geracoes e a juventude portuguesa em geral esta a caminhar para um futuro terrivelmente incerto, de precariedade, de imaturidade e de apatia balofa que ira prejudicar o rumo do proprio pais, com acento no i. Por um lado Os pais nao responsabilizam os filhos e trazem-nos nas palminhas, por outro os filhos nao conseguem alcancar a maturidade necessria, por via do paternalismo superlativizado e das faltas de oportunidade de caracter geral, por efeito, e uma vez que tambem nao conhecem as virtudaes dos sacrificios, enquanto formadores de caracter e de espirito corajoso e dinamico, nao serao adultos capazes, e toda a sociedade estara inexoralmente minada ao fracasso. O futuro de Portugal? Negro como breu.

    ResponderEliminar
  3. Eu cá estou com alguém à moda antiga. Tem tudo de bom dos tais anos redondos. Concordo com cada palavra e ri-me muito naquela do deitar na cama onde tantas vezes se mijou....acho que é esse o espírito de hoje em dia, o de andar eternamente de fralda.
    Uma coisa é certa, em vez de se preocuparem tanto com a roupinha à antiga, era porreiro que se preocupassem também com alguns valores esquecidos dos antigamentes, independência, luta, vontade, força, respeito pelos mais velhos, coisa que sinto vergonha do que vejo nas notícias...os meus pais e avós vão ter a velhice que merecem, cuidarei deles tão bem como me cuidaram toda a vida.

    Abençoados aqueles que reagem, que lutam pela sua independência. Viva a nós! Olha! Então o antigo está na moda?? Eu estou na moda?? como dizia o outro.."porreiro pá..."

    ResponderEliminar