14 setembro 2006

1/8/06 13:26h A caminho de Budapeste

Nestes dias temos passado do paraíso para o inferno….
Depois de escrever no diário, a rapariga que estava à nossa frente no comboio começou a meter-se comnosco e a fazer perguntas. Ela e o namorado são repórteres que moram em Bucareste e iam passar o fim-de-semana nas montanhas, em Bram, tal como nós. Assim como eles eram de cá começaram a explicar-nos o que deveríamos ou não ver. Explicaram-nos como íamos para Bram, porque não era assim tão fácil. Ao sair da estação em Brasov tínhamos que apanhar o autocarro 23 e ir para a outra rodoviária no outro lado da cidade, e daí apanhar um outro autocarro mesmo para Bram (onde estão as montanhas). Eles foram comprar o bilhete e foram até à outra estação comnosco. Ao entrar para o autocarro a minha mãe sentiu uma mulher a abrir-lhe a mala e mal se virou a mulher desatou a correr, a Sheila disse que era normal e para termos muito cuidado com as nossas coisas. Quando estávamos à espera do autocarro vimos também uma cena muito estranha de ciganagem. Um homem cigano, que segundo a Sheila, devia ter acabado de sair da cadeia, estava aos gritos no meio da rua, com as costas todas chicoteadas e com uma mulher e um bebé atrás. Logo a seguir apareceu a bófia, que aqui anda de capuz na cabeça para proteger a identidade, estes senhores de negro levaram o cigano debaixo do braço e estavam a falar com ele. A Sheila explicou-me que eles deviam andar à procura de alguma coisa ou de alguém cujo paradeiro era conhecido pelo dito homem, e as costas deve ter sido resultado duma conversa amigável…. Coisas da vida!
Bom, de volta ao autocarro tivemos que esperar aí uma hora por um que fosse para Bram, eles tiveram que ir embora pois iam às compras, mas que mais tarde nos encontraríamos em Bram.
Enquanto estivemos à espera do autocarro aconteceram todo o tipo de peripécias e apareceram todo o tipo de pessoas. Um rapazito todo sujo andava a pedir dinheiro às pessoas, o estranho era que passava sempre por nós sem nos pedir nada, aqueles a quem ele pedia viravam-lhe a cara, nós dispostas a ajudar a pobre criança fomos ignoradas à grande, mas com a minha alma bondosa e caridosa, praticamente enfiei-lhe as moedas pelo nariz acima, para ele perceber que queríamos ajudar, lá pegou no dinheirito e foi à vidinha dele. Depois estive muito tempo a conversar com uma velhota que lá estava, de chapéu com flores, ela em romeno, e eu em portunglês, nem sei bem como, deve ser um dom que adquiri, possivelmente o meu poder, consigo conversar durante um tempo considerável sem perceber uma palavra da língua da outra pessoa, mas que nos entendíamos, entendíamos… Depois de muita espera chegou o aguardado por milhares, autocarro para Bram, mas mal o senhor condutor sai do autocarro, as pessoas apinharam-se à porta e o senhor olha com todo o ar de “tenho o poder”, caga na cabeça dos cidadãos ansiosos, e vai almoçar mais uma horinha… raça de funcionário públicos que precisam de almoçar….
Quando por fim lá entrámos no autocarro, eu a minha mãe, a senhora do chapéu com flores e mais 300 amigos nossos, isto num autocarro de 30 lugares. Assim, iam uns em pé, outros sentados, outros em suspensão, acho que se foram enfiando nos lugares possíveis e imaginários. A minha mãe e eu estávamos sentadas, com as mochilas de 20kg no colo, ela foi pisada uma data de vezes, tanto que ficou com a unha roxa, os que estavam em pé estavam tão encaixadinhos uns nos outros, que acho que deve haver um curso para aquilo… é claro que no meio disto vi mãos a tocar onde não deviam, mãos e não só! E assim, o que supostamente era uma meia hora de caminho pareceu uma eternidade, nem conseguíamos ver as horas, porque realmente era impossível mover um músculo que fosse, a não ser claro, a língua.
Quando por fim saímos da lata, tal atum a saltar para a salada, tivemos uma visão do paraíso… Bram é linda, recomendadíssima! Uma pequena vila nas montanhas, tal qual se vê nos contos de fadas!
Mal chegámos lá, veio um rapazinho ter comnosco e depois de regatear preços (estou uma verdadeira tendeira “é a 500, menina, é a 500!”), lá nos arranjou um quarto num chalet por 50lei, que é mais ou menos 12€, uma pechincha.
E assim, nós no nosso chalet nas montanhas, todo em madeira, com salinha, com vista para as montanhas, e tudo muito limpinho, que é o que se quer!
Tomámos o nosso banho de recuperação e fomos passear.
Almoçámos no “Drácula market”, e mais uma vez foi tudo na base da surpresa, pois pedir coisas dum menu romeno, sem perceber pickles do que aquela gente diz ou come é tipo tentar jogar no euromilhões estomacal, nunca se sabe o que o estômago vai ganhar!!
Pois, bem, mais uma vez o meu “guia do mochileiro” veio em meu auxílio e descobri que ciorba quer dizer soba, bom e a minha brilhante dedução foi que ciorba de legume, seria sopa de legumes. Sou ou não um génio?!
De todas as vezes que comi na Roménia tentei evitar os pratos que diziam cascaval, porque para mim, esta gente comia cobras e muito mais, e ainda por cima punha nos menus… mais tarde vim a descobrir pela Sheila que cascaval é uma espécie de mozzarela que eles põem na comida, ora todos os pratos que pedi tinham uma cena estranha e branca (vá, não sejam porcos, não levem isto para o lado da cueca! Acho que fundo a porca sou eu, porque mal escrevi isto pensei em coisas tristes… ), ora eu fartei-me de comer cascaval sem querer, e tenho a dizer que não gostei!
Mas a Roménia foi de todos os sítios onde comemos melhor, pelo menos há carne, e esta tem acompanhamentos reais…
O nosso chalet era muito agradável e a senhora muito simpática, até nos lavou a roupa e tudo.
Fomos passear pela vila, ver os chalets, as montanhas, pessoas a tomar banho nos riachos, e a passear pelas montanhas… um sonho!
Assim, cheias de entusiasmo lá fomos nós conhecer o castelo do conde drácula, achávamos nós…
Bom, na realidade o castelo do Conde drácula não tem absolutamente nada a ver com o dito senhor. Era um castelo de uma família real qualquer da Roménia, cuja Rainha Mary e seus filhos emolduravam grande parte do castelo. Mas tenho a dizer que o castelo é lindissímo, mesmo dos mais bonitos que eu já vi até agora.
Quando lá entramos temos que calçar pantufas por cima dos sapatos, porque o chão é de uma madeira muito antiga e poderá riscar-se ou sujar-se se as pessoas andarem por lá com os próprios sapatos. O castelo tinha mobílias antiguissímas, com passagens secretas e corredores estreitos, varandas belissímas, e com todas as salas e salões a que a realeza tem direito!
É muito pequenino, a comparar com os imponentes palácios e castelos que já vi, era também muito baixo, acho que as pessoas naquela altura tinham uma estatura muito baixa, o tecto era acessível em várias zonas do castelo, parecia que estávamos no Portugal dos pequeninos.
O comércio da zona, pequenas barracas ao longo da aldeia, é todo feito à base do Conde Drácula, porque realmente muita gente vem cá por causa dessa lenda.
A Sheila explicou-me a lenda do Conde, o senhor realmente existiu sim, mas como é óbvio não era nenhum ser sanguinário, e o hábito deste se deslocar à floresta (a transilvânea é lindíssima) e fazer coisas estranhas nas árvores criou uma lenda que salvou a Roménia (aquela zona) de muitas invasões, porque o medo desta criatura era geral, e é assim que se criam lendas e mitos que perduram para sempre, e como é óbvio a aldeia faz negócio deste tema.
Até há uma pequena casa do terror, onde eu e a minha mãe fomos. Já estava mesmo a ver a cena, ela morria de taquicardia e a família culpava-me por a levar a lugares daqueles… foi lindo a sério !! Tudo começou na entrada, onde um senhor maquiado a preceito nos colocava pulseiras do tipo queima das fitas, quando me estava a colocar a pulseira a mim, deve ter reparado que a minha mãe estava com medo, assim, disse simplesmente “Bu”, o suficiente para ela mandar um grito daqueles, no meio daquela gente toda… lá dentro já se imagina como foi, eu nem me conseguia assustar porque só me ria da figura dela, a cada cena que passávamos ela gritava e eu mandava-a embora de volta, não fosse ela ter um ataque cardíaco, mas ela queria ficar… numa das vezes, em que dum pano preto saltou uma mão que nos agarrou, a D. Narcisa manda um pulo que derrubou umas cenas que lá estavam, foi a loucura, o coração ao rubro… muito bom, posso dizer que ia matando a minha mãe!
Depois deste susto, e para acalmar a circulação fomos passear pelas casinhas medievais que havia por baixo do castelo. Era possível ver o interior, com as roupas da época, e tudo recreado ao pormenor. Esta é mesmo uma vila de sonho, adorei tudo.
Comprei uma flauta Romena, que já nem me lembro do nome, e não faço ideia como se toca, porque tem um buraco a mais, mas é muito gira.
Quando voltámos ao chalet tivemos uma surpresa, no quarto ao lado do nosso estava a Sheila e o namorado, o mesmo rapaz que nos arranjou o quarto, quando teve a falar com eles falou-lhes de nós, e assim foram para o mesmo sítio fazer-nos uma surpresa.
Tivemos a conversar sobre o que tínhamos estado a fazer e eles convidaram-nos para ir passear nas montanhas, a minha mãe não queria ir porque estava cansada e eu achei melhor deixá-los ir sozinhos, para namorarem.
Ficámos então a descansar e a ver novelas, eu arrumei as minhas coisinhas e depois fomos jantar. Quando voltámos, eles tinham regressado com uma melancia que tinham achado na montanha, o rapaz andou 2km com uma melancia ao colo, nada pequena por sinal, assim lá fomos nós comer a “peparani” (mais ou menos, melancia em romeno) para o quintal e tivemos a conversar até às tantas da noite.
Estivemos a ensinar uns aos outros um pouco de cada língua, e ficámos surpreendidos com a quantidade de semelhanças que há, afinal de conta temos ambos línguas latinas, e se falarmos devagarinho e pausadamente, consegue-se perceber muito bem o que cada um de nós diz, ela tinha net no portátil, assim esteve-me a mostrar o horário dos comboios e a sugerir sítios para visitarmos, depois de muitas horas, lá nos despedimos e fomo-nos deitar.
Acordámos bem cedo de manhã, por volta das 6h, para apanhar o autocarro para Brasov, um que pelo menos tivesse metade das pessoas que tinha quando viemos.
A partir daqui é que tudo começou a correr mal…
Chegámos a Brasov para apanhar o autocarro para a estação de comboios, mas este nunca mais chegava, entretanto chegou um onde entrou toda a gente e eu perguntei se ia para a estação, o senhor respondeu-me “garaje”, ora na minha terra isto significa a garagem dos autocarros, que era para onde queríamos ir, para depois ir para a estação. Entranhei logo quando o bilhete foi muito mais caro que o que tínhamos pago quando viemos, e quando este começou a andar em direcção ao sítio de onde tínhamos vindo, então aí é que foi o desespero. Saímos na primeira oportunidade, o que significa no meio de nada. Ali estávamos nós, no meio de nada, numa zona industrial qualquer, às 6h da manhã e com tudo fechado, só mesmo eu é que me meto nestas coisas… Entretanto encontrámos um senhor velhote na rua que nos disse que estava à espera do autocarro para Brasov também, e então lá ficámos com ele à espera do próximo. Ao chegar à estação, mais uma vez, fomos logo para um táxi, mas até achar um foi um filme… estavam todos cheios, todos ocupados e os que estavam vazios, não estava lá ninguém para nos levar… eu já dizia mal da minha vida… entretanto um senhor que também tinha o táxi ocupado, resolveu levar-nos também, por fim, depois de muito tempo, nervos e angústia lá apanhamos o primeiro comboio para Sighisoara, uma cidade medieval com um festival a decorrer.
Ora o que eu estranhei logo foi o comboio estar lotado de metaleiros, todos de negro, com as suas t-shirts dos metállica, sangue e do Demo, e com correntes a arrastar no chão, realmente não me parecia que fosse o género de pessoas que fossem para um festival medieval, mas claro que para minha surpresa, saíram todos lá. Assim, a estaçãozinha de Sighisoara estava apinhada de gente do mal, e quando eu falo em estação refiro-me, claro, a dois contentores com cheiro a urina ou a coisa pior.
Depois de, o que me pareceu uma eternidade, ao calor, numa fila com gente que adora o demónio, lá fui atendida, para me dizerem que só podia marcar a reserva para o comboio que pretendia ir, com uma hora de antecedência, ora o comboio era só às 13h, assim só às 12h é que me faziam a reserva, e isto eram para aí umas 10h, assim fomos dar uma volta.
Fomos então passear pela cidade de medieval, que de medieval não tinha nada, tem edifícios e igrejas bonitas, como a grande maioria das cidades, lá tem a sua floresta como a grande parte da Roménia, mas sinceramente, de medieval nem os machados…e o tal festival medieval não eram mais do que barracas de carne e cerveja, com um palco que devia dar concertos metal, e por cada duas barracas de coisas yeeee, lá havia uma ou outra com pedras da sorte e assim. Conclusão: Medieval em romeno, quer dizer qualquer coisa, que não o mesmo que em Portugal!
É claro que este era o último dia do festival, se calhar assim o medieval daquilo já tinha ido embora, vimos um casal vestido de modo tradicionalmente medieval, sim senhora, mas isso o único vestígio, da suposta cidade medieval, invadida por gente estranha… assim lá voltámos para um comboio apinhado de gente, e a nossa ideia era ir para Shinaia, uma cidade, que segundo a Sheila, tinha uns castelos ainda mais bonitos que o de Bram. Moral da história, os castelos ficaram para depois, porque adormeci no comboio e deixei passar a estação, então tentando falar em romeno com um casal idoso que estava na mesma carruagem que nós, percebemos que a cidade já era que estávamos a caminho outra vez de Brasov… já estava farta desta estação!
Assim, de Brasov fomos para Constanza, a terra da Sheila, onde fica o mar negro, depois daí iríamos para Tulcea, onde se situa o delta do Danúbio.
Bom, de negro só a cidade mesmo, porque quando lá chegámos era de noite. Chegámos à estação por volta da meia-noite, mal saímos do comboio veio uma senhora perguntar se queríamos quarto, a seguir a essa vieram mais quatro ou cinco que começaram a discutir umas com as outras a ver quem ficava com o bife, eu mandei um berro no meio daquela confusão e disse que não queríamos quarto nenhum, mas mal saímos da estação, com ideia de irmos para um hotel, apareceram 30 taxistas a lutar por quem nos levava, ora em pensei mesmo que estava entregue aos leões, agarrei na minha mãe e voltei para a estação, assim lá ficámos até às 4h da manhã que era a hora do comboio para Tulcea, e tornou-se perigoso sair da estação porque os abutres estavam lá fora!
Se bem que dentro da estação não nos sentíamos muito seguras também, aquilo era só ciganagem e gangs, e como as barraquinhas ao pé dos comboios estavam abertas aquilo era como o point da zona, vi cenas do diabo, um grupo de putos descolorados e maus atrás dum outro miúdo, e aposto que lhe bateram e mais tarde roubaram um chapéu dum policia e andavam a desfilar com ele pela estação, isto com uma esquadra lá!
Mais uma vez tentamos sair da estação só para tentar ir para um hotel tomar banho e assim, mas mal pudemos o pé na rua vieram 20 taxistas, aquilo realmente era assustador, desistimos e voltámos para dentro.
Eu, cravada de frio e de sono enfiei-me dentro do saco de cama e dormi no chão nojento daquela estação, assim no meio do perigo, pode-se dizer que a gozar com perigo! Mas claro que tinha a minha mãe de guarda e não há nada mais seguro do que a mãe a guardar a cria, ela não quis dormir porque estava cheia de medo. Assim, lá se passaram 4h e fomos até Tulcea.
Segundo o meu guia, esta cidade é o paraíso dos ornitólogos e botânicos, porque está no delta do Danúbio, uma explosão de biodiversidade, daí eu ter vindo.
Quando chegámos à estação não estava lá ninguém. Era uma estação bonita, limpinha, mas não tinha funcionários! Só tínhamos comboio às 15h, assim fomos dar uma volta e fomos procurar um sítio para tomar banho.
Fomos então para um hotel de 3*, o único que encontrámos, todo pimpão, como era só para tomar banho e estávamos desesperadas, lá regatei com a senhora que não ia pagar 80€ por um quarto só para tomar banho, consegui baixar para os 50€ e lá fomos nós, tomar banho, arrumar as coisas e descansar um bocadinho num quarto de luxo.
Acho que grande parte dos preços altos que pagámos nesta viajem, muitas vezes foi por cansaço de procurarmos mais, porque já estávamos tão exaustas, porcas e esfomeadas, que concordámos em pagar 50€ para tomar banho, nunca em minha sã consciência em aceitava uma coisa dessas…
Depois de limpinhas, ainda roubei uns chocolates do mini bar, mas como sou honesta fui pagar, tive mesmo vontade de fazer uma razia àquilo, afinal 50€ dá para comer por 2 semanas…
Depois voltámos para a estação e acabámos por não ir ver o delta porque tínhamos que ir de barco, e acho que era um bocado caro, assim passeámos pela, cidade que é banhada pelo ria Danúbio, e que até é engraçadita!
Fomos almoçar a um restaurante, e enquanto lá estávamos alimentámos uma cadelinha que andava lá de volta, mais tarde na estação descobrimos os filhotes dela, tão lindos, tão lindo, só tinha vontade de os trazer … 4 cãezinhos abandonados numa estação, tadinhos. Lá também estava uma cigana com uma bebé nua, que andava dum lado para o outro a pedir dinheiro, porque a mãe ensinou-a a estender a mão aos estrangeiros, a minha mãe teve muita pena da miúda, tinha um problema qualquer porque tinha um tubo no nariz, e andava ali descalça, nua e toda sujinha, há coisas que me metem uma raiva, aquela mãe, por exemplo… lá demos dinheiro á criança, que claro era para a mãe!
Depois telefonámos para casa, e fomos comprar o bilhete para voltar para Bucareste, pois precisámos de ir à capital para podermos comprar o bilhete internacional para Budapeste, na Hungria.
Mais uma volta, mais uma voltinha, no comboio da alegria! As crianças não pagam, e cocó para elas que também não andam!


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